A casa, não mais lembra os áureos
tempos da fartura, das crianças correndo, da grama aparada e arames esticados.
Sentado no “mochinho”, cuia na mão, barba por fazer, olhos ao longe, naquele
silêncio fortuito, as lembranças vão e vem, pulando a cerca dos anos, num
piscar de olhos.
Por que a vida corre na velocidade de um
galope, e as lembranças, na velocidade do rodado da carroça? No atropelar de um, a distância aumenta, e a
poeira esconde as lembranças, e com elas, fatos e momentos marcantes se vão perdendo
no tempo.
Por mais que
tente, a memória prega suas peças, e vai deixando muito dos acontecidos de
antes, num potreiro distante, de difícil acesso. No silêncio, os sons são os
mesmos, o casal de joão-de-barro, na figueira, agradecem num coro perfeito, a
chegada da ninhada bem criada; as catorritas, cruzam igual caminho em busca do alimento,
até parecem ás mesmas, que proporcionaram boas histórias a eles; a falha na
grama, onde brincavam, de diferente, somente a ausência deles, a construir
mangueiras e potreiros na terra solta.
Quanta vez
pensou em questionar Deus por deixar sempre a natureza tão igual, os dias
tranqüilos, o vento seco e morno a seguir seu rumo, empurrando os galhos dos
ciprestes num dançar ensaiado, e, toda essa beleza tão igual e perfeita, a
contrastar com a distância dos ausentes, da tinta desbotada das paredes; da
grama sem corte, das folhas escondendo o local das mangueiras de areia, e da
ausência das vozes na comunhão sem par?
Sabia que tal questionamento
era impossível. Junto com os dias, que dão lugar aos próximos, “eles” vão também.
Ficam as lembranças, e a força para aceitar que a vida é passageira mesmo, e
devemos deixar o amanhã para quando fechar as porteiras do hoje. O agora, este
sim é importante, nos proporciona ver toda a beleza da natureza, e esperança de
poder seguir projetando os sonhos.
A lembrança é
egoísta, clama pelo retorno do tempo, nem que por um só dia. Saberia valorizar
mais cada segundo, cada detalhe, antes com tão pouca importância, agora teria
atenção especial. Aquele pedido de ajuda, na construção da estrada de areia, seria
partilhado com mais cumplicidade. As campereadas, a mostrar os caminhos da
invernada, melhor aproveitadas, e com ensinamentos mais intensos. Ás perguntas
sem repostas, a paciência com limite, conspiram contra, na lembrança do tempo
que não volta mais.
E, solito,
sorvendo mais uma cuiada, restam ás poucas recordações a preencher a solidão,
numa mistura de tristeza pelo que passou, e um resquício de alegria, na
compreensão dos erros cometidos, e a certeza de não mais repontá-los na próxima
vez.
“Cada segundo da vida é único e especial, e
a intensidade com que comungo esses momentos, é que me fará mais ou menos
responsável pela alegria ou tristeza dos meus pensamentos”, remoia a
memória do velho, no sabor do amargo de mais uma cevada...
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